sábado, 30 de abril de 2011

Mais de uma semana

Ele sentou, olhou tudo a sua volta. Observou como tudo se tornava tão mais belo na escuridão de seu apartamento, iluminado somente pelas válvulas do velho rádio e a ponta do cigarro ao qual tragava em intervalos quase cronometrados. Ensaiava a tão esperada morte, enquanto a tão esperada morte batia em outras portas, portas que não queriam se abrir. A maior espera é daquele que espera não? Já fazia mais de uma semana em que tudo tinha acontecido, o que tudo na verdade não era mais nada que a mesma rotina, a falta da rotina. Já fazia mais de uma semana que ele achava que a felicidade era o único destino e que ela iria aumentar de acordo com os juros em sua conta bancaria. Sim, mais de uma semana, sem fazer a barba, sem sair de casa por prazer, sem ter alguém em sua casa por prazer, deixou o velho hedonismo de lado um pouco, e o tempo só passava, a angustia crescia de acordo com sua barba, ainda falhada.
Não havia clichês como a chuva batendo na janela, nem mesmo o copo de whiskey, não havia uma musica do Cure ou do Legião Urbana. Havia uma semana que ele não ouvia nada, a não ser o chiado nostálgico do rádio, e eu, todo dia parava la para assisti-lo. E o ouvia falar, como se eu fosse a terceira pessoa, mas eu estava la, por que ele não podia falar em segunda? Tu nunca disseste nada para mim, mas rezava, rezava para que eu o salvasse, ou condenasse. E então, por não falar comigo, passei mais um dia pela sua porta, entrei sem bater e fiquei só observando, pois havia mais de uma semana que poemas eram espalhados pelo chão, acordes tocados e uma voz rouca sussurrava: leve-me, salve-me. E inconscientemente eu lhe salvava, até seu grito ser ouvido...

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